terça-feira, 17 de novembro de 2009

Missionários, prego na estrada e índios

Redenção, 17 de novembro de 2009.


No avião, sento ao lado de duas missionárias de igreja evangélica qualquer, meia idade estampada nos rostos, frases rápidas e voz alta. A que está ao meu lado, poltrona do meio, aparenta extrema calma. Já a outra, na janela, parece nervosa, oração que não pára, o medo revelado nas palavras cada vez mais exaltadas...


“Pai! Em tuas mãos entrego minha vida e este vôo...”

A que não prega continua a conversar comigo. Conta ter vindo de Fortaleza ainda muito nova, se chama Paula e vende perfumes nas horas vagas, o evangelho sendo sua real vocação. Me explica que vai a Marabá visitar famílias, programa da igreja para ficar sempre ao lado de seus crentes...

“...a sua misericórdia é imensa, meu Deus...”

Me conta que pretende ter sua própria fábrica de perfumes, acabar com essa história de enriquecer os outros...

“...e confio nas tuas palavras sagradas, Senhor...”

O homem do meu lado, no outro corredor, olha-me com pena e reprova a fé da missionária que ora, a voz altíssima que perturba a todos. Para meu espanto ele próprio puxa papo comigo, palavras críticas e provocativas às minhas companheiras de vôo, algo que entendo como afronta desnecessária. Nem tanto ao céu, nem tanto ao mar, fecho os olhos e tento dormir sem brigar com ninguém.
(...)
O táxi voa e me deixa no Terminal e Feira Miguel Pernambuco, também conhecido como Rodoviária do Três. Pelo nome, fiquem livres para imaginar o que bem quiserem sobre o local, mas eu vou ajudar: são 06h30min e o Terminal já está sujo, restos de comida pelos cantos, copos e garrafas plásticas largadas por tudo. Há uma revoada de moscas que busca se alimentar, bichos que me impossibilitam de escrever, braços e mãos feito pista de pouso! Mudo de lugar duas, três vezes... Desisto! Parece que sou o único que se incomoda, os outros passageiros em estranha letargia, a sucessão de ônibus e vans sujas no pátio, o embarque constante de móveis, caixas e crianças, a miséria estampada em tudo!

Meu ônibus chega com pequeno atraso, o radiador quebrado perto de Marabá, problema rapidamente contornado pelos mecânicos da empresa. Embarcamos, mas são poucos os lugares vagos, ônibus cheio de gente disposta a encarar em pé as seis horas de viagem! Consigo uma poltrona, sento e rapidamente durmo, sono leve que termina duas horas depois com parada repentina em posto de gasolina no meio do nada. “O radiador quebrou de novo”, me explica um companheiro de infortúnio. Descemos todos e montamos acampamento em uma sombra, o motorista e seu co-piloto metidos sob a carcaça de metal tentando reparar o carro. Ao percebere que a luta tinha acabado, derrota do radiador, o motorista larga os passageiros na churrascaria de outro posto de gasolina, já em Xinguara, enquanto o ônibus era levado à garagem, solução definitiva do problema, prometiam! O almoço era pouco, restaurante pobre de opções, quase tudo só feijão e arroz.

Optei por dividir a mesa com família de índios que estava no mesmo ônibus que eu. O pai se chama Dudu Kayapo e estava viajando com suas
filhas, Nhaprati e Ngrenhmoro Kayapo, voltando de São Felix do Xingu, festividade de outra aldeia. Pretendiam chegar em sua casa, na aldeia Lascasa, em Pau d´Arco, ele cansado da festa e do cuidar das meninas. Elas não falavam português mas entendiam bem! Perguntei ao pai se podia oferecer picolés às meninas, ele permitiu e elas vibraram. Mas as pequenas não sabiam como tirar os envelopes plásticos, tarefa executada por mim. Por fim pedi uma foto das filhas, as duas muito bem comportadas e simpáticas. O pai respondeu feliz: “Claro que pode fazer a foto! Mas quero ver, depois.” Fotos tiradas e aprovadas, voltamos correndo para ônibus recém chegado, o motorista que buzinava impaciente reunindo seu rebanho maltratado. Me restava uma hora de viagem até Redenção e muito sono acumulado.

6 comentários:

Anônimo disse...

Cara, fantástica a história... teus ' diários de viagem' são muito bons e divertidos rs.

Feliz tb por teres aprendido a editar as fotos, ou mexestes na máquina?

(caí do 3G na hora q te perguntava isso e fui dormir. viva teu 'uairilessis' atual rs).

As fotos estão sem a ' nuvem de fumaça', enfim...

Desejo um bom , porém, emocionante retorno a capital rs

W

Tanto disse...

Por que achas que opto sempre pelo forma mais complicada de viajar? Por que assim tenho sempre o que escrever, muitas histórias e coisas interessantes. A volta vai ser, certamente, boa! Mas vou ficar atento a tudo para novos textos.

Abraços!

Tatyane Garcia disse...

Linda a foto das duas meninas, Formiga! Como fazes pra ficar preto e branco??

beijos!

Luana Castro disse...

Adorei a parte da missionária orando alto kkkk. Deve ter sido muitoooooo engraçado!

Mas o que mais gostei mesmo foram as indiazinhas...pq será? kkkkk

Beijos.

Tanto disse...

Taty! Das duas uma: ou fazes a opção na tua máquina, ou usas um programa de edição de fotos que faça as mudanças para ti! Mas é a coisa mais simples que há!

Luana, a missionária falava muito alto, você não imagina! Já as índias... não sei! Porque será?

O Gnomo Verde disse...

Purisso que detesto essas crente, so sabem gritar que jesus aqui jesus isso. Na floresta donde eu vim num tinha disso não. tá bacana a foto das meninas indio