sexta-feira, 16 de julho de 2010

Mulheres de Belém - Maria Odete

Maria Odete tem 62 anos e pede esmola na escadaria da Basílica desde os 60. Faça sol ou chuva, toda tarde a mulher se senta na porta da igreja e, tricotando, espera que a ajudem com troco qualquer, dinheiro para sustentar a neta de 14 anos, filha de sua filha e sua única companheira.

A mãe sumiu no mundo e deixou para a avó a responsabilidade de criar a pequena, dever cumprido com sacrifício do orgulho, sentimento incompatível com a condição que ela assumiu: de vez em quando acontece de me mandarem trabalhar, de me chamarem de vagabunda e preguiçosa. Eu não ligo, finjo que não é comigo. Sou conformada com a minha condição. Afinal, quem empregaria uma mulher da minha idade, doente e sem estudo? Tentei durante meses e descobri: ninguém!

Ela não tem noção de quanto recebe em um mês. Sabe somente que é dinheiro suficiente para mantê-las e para suprir as necessidades mais prementes da casa humilde no bairro da Pedreira.

Antes de pedir esmola Maria Odete foi empregada doméstica. Durante anos, desde que se entende por gente, trabalhou em casa de família. Mas então a idade chegou e, com ela, o cansaço para as tarefas mais banais e um problema crônico de estômago que lhe aflige diariamente. Um dia foi mandada embora e nunca mais teve outra oportunidade, as dezenas de portas batidas que corresponderam a dezenas de sonoros nãos. E com a neta para criar, sem ter outra opção, resolveu sentar nas escadas da Basílica e de lá, moeda em moeda, vem sobrevivendo.


As melhores épocas para pedir esmola, segundo ela, são o Natal, a Páscoa e o Círio. Motivados pelo espírito coletivo de bondade, os fieis oferecem às pedintes que ficam diante da Basílica cestas de alimentos, roupas e sapatos.

E os mais generosos, segundo ela, são aqueles que freqüentam a missa diariamente, gente que a conhece de sempre estar lá e sabe que não é pessoa ruim. Alguns chegam a oferecer, mensalmente, de cinqüenta a cem reais, espécie de dízimo sem atravessadores.

Generosa mesmo é Maria Odete, mulher que ofereceu seu orgulho à humilhação diária de pedir esmola na escadaria da Basílica de Nossa Senhora de Nazaré, chuva ou sol feito, mulher que engole a seco ofensas e descaso diante do dever de criar a neta.

5 comentários:

Anônimo disse...

Não dou esmola. Sou contra. Não concordo.

Mas te amo mesmo assim e acho tão liiiindo quando você dá esmola.

Mas eu sou contra ;-)

Bocó.

Lafayette disse...

Emocionei-me!

Anônimo disse...

Procurarei por Odete nas escadarias da Basílica.

E a ajudarei com certeza. Bom conhecer algumas mulheres de Belém.

Obrigada.

Tanto disse...

Anônimo Boco, perceba que não escrevi que dei esmola também. Na verdade, igual a você, sou contra.

Lapha, obrigado. Me ajuda a achar outras mulheres de Belém. Dona Ester ia ser uma boa.

Anônimo das 06:12 - encontre e ajude. Ela é uma pessoa muito legal.

Luiza Montenegro Duarte disse...

Adoro sua visão das mulheres, Fernando. E que mulheres as que você traz pra cá!